Texto: crise ameaça bem estar social europeu
The New York Times
Em toda a Europa Ocidental, o estilo de vida está
Os europeus se beneficiaram dos gastos militares baixos, sob a proteção da OTAN e do guarda-chuva nuclear americano. Eles também transformaram impostos altos em uma rede de proteção que vai do berço à sepultura. A Europa que protege é um lema da União Europeia. Mas todos os governos da Europa com grandes orçamentos, receitas fiscais em queda e envelhecimento da população enfrentam o aumento do déficit - e outras notícias ruins adiante.
Com baixo crescimento, ínfimas taxas de natalidade e uma expectativa de vida cada vez maior, a Europa não poderá manter seu estilo de vida confortável por muito tempo, especialmente sem um período de austeridade e mudanças significativas. Os países estão tentando tranquilizar os investidores cortando salários, aumentando a idade da aposentadoria, ampliando as jornadas de trabalho e reduzindo pensões e benefícios na área da saúde.
Estamos em modo de recuperação, disse o ex-primeiro-ministro e atual ministro das Relações Exteriores da Suécia, Carl Bildt. Mas teremos de fazer a transição para o modo de reforma
Em Atenas, Aris Iordanidis, 25 anos, um economista que trabalha numa livraria, ressente-se de pagar impostos elevados para financiar um estado inchado. Eles ficam lá por anos, tomando café e conversando ao telefone e depois se aposentam aos 50 anos com salários gordos, disse ele. Quanto a nós, pela forma como as coisas estão caminhando, teremos de trabalhar até chegar aos 70. Em Roma, o professor de fotografia Aldo Cimaglia tem 52 anos e está profundamente pessimista em relação a sua aposentadoria. Estão empurrando com a barriga, pois ninguém estará por perto para encher os cofres da previdência, disse. Não se trata só de mim, o país não tem futuro.
As mudanças seriam necessárias de todo jeito, mas agora tornaram-se urgentes. A população da Europa está envelhecendo rapidamente. O desemprego cresceu e indústrias tradicionais se mudaram para a Ásia. A região geralmente apresenta pouca competitividade nos mercados globais. De acordo com a Comissão Europeia, em
O tempo bom ficou para trás em países como Grécia, Portugal e Espanha, mas para nós também, disse Laurente Cohen-Tanugi, advogado francês que preparou para o governo da França um estudo sobre o papel da Europa na economia mundial. Muitos europeus não vão gostar da forma como coloco a questão, mas esta é a tempestade que estamos enfrentando. Não podemos mais suportar o velho modelo social.
Em Paris, Malka Braniste, de 88 anos, vive da pensão do marido falecido, que vendia roupas de porta
Gustave Brun dArre, 18 anos, ainda está no colégio. A única coisa que ouvimos é que teremos de pagar pelos outros, disse, ao mesmo tempo que bebericava uma cerveja num café. O garçom interrompeu, discutindo planos para alterar o sistema de aposentadoria francês. Vai ser uma bagunça, disse o garçom. Vamos trabalhar mais e por mais tempo em nossos empregos.
Os números mostram a gravidade do problema. Os gastos sociais dos governos
O desafio é particularmente gigantesco na França, que terá de reduzir os gastos do estado muito mais que seus vizinhos. Na Suécia e na Suíça, sete de cada dez pessoas que trabalham passaram dos 50 anos. Na França, só a metade. A idade legal para aposentadoria na França é de 60 anos, enquanto na Alemanha ela subiu de 65 para 67 anos para os nascidos depois de 1963. Com a aposentadoria da geração que nasceu depois da guerra, os baby-boomers, o número de pensionistas crescerá 47% entre hoje e 2050, enquanto a porcentagem da população com menos de 60 anos permanecerá estagnada. Os franceses chamam isso de du baby boom au papy boom . Os custos, se nada mudar, são insustentáveis. O sistema de previdência estatal francês tem hoje um déficit de 11 bilhões de euros. Em 2050, chegará a 103 bilhões de euros, algo como 2,6% do PIB estimado.
O presidente Nicolas Sarkozy pretende aprovar uma grande reforma previdenciária ainda este ano. Houve duas revisões, em 2003 e 2008, que acabaram
Jean-François Cope, líder parlamentar do partido de centro-direita de Sarkozy, disse que as mudanças são doloridas, mas necessárias. O ponto é como preservar nosso modelo e mantê-lo, disse ele, ainda que reconheça que a palavra austeridade tornou-se politicamente sensível. Nós precisamos nos livrar de práticas ruins. Os alemães fizeram isso, e nós precisamos fazer a mesma coisa.
Muita gente na Europa afirma que o continente terá de se adaptar às mudanças demográficas e fiscais, porque a paz social depende disso. A Europa não vai funcionar sem a função protetora do estado, disse o ex-ministro de Relações Exteriores da Alemanha, Joschka Fischer. Na Europa, temos o racismo e o nacionalismo como questões políticas e seus partidários teriam explorado essas queixas se não fosse o estado de bem-estar social, disse ele. Ele é a razão de nosso segurança nacional, de nossa democracia.
A França acabará por seguir a Suécia e a Alemanha e elevar a idade da aposentadoria, argumenta Fischer. "A questão terá de ser harmonizada, europeizada, ou não vai funcionar. Você não pode ter aposentadoria aos 67 anos aqui e outra aos 55 na Grécia."
Os problemas são ainda mais agudos nas novas democracias da zona do euro: Grécia, Portugal e Espanha, que adotaram os ideais democráticos europeus antes que suas economias estivessem prontas. Construíram sistemas de proteção social que agora talvez tenham de mudar. Sob ameaça de moratória, a Grécia congelou as aposentadorias durante três anos e pretende elevar a idade mínima para 65 anos. Congelou os salários do setor público e cortou benefícios para funcionários públicos, incluindo um bônus de dois meses de salário. Portugal reduziu em 5% os salários de altos funcionários públicos e de políticos, aumentou impostos e cancelou grandes projetos de investimento. A Espanha está cortando salários da administração pública em 5% e possíveis aumentos no ano que vem. Mas todos os três países precisam mais do que isso para recuperar sua competitividade e crescer, principalmente fazendo grandes mudanças estruturais e flexibilizando leis trabalhistas que tornam proibitivo demitir ou contratar funcionários e mantêm o desemprego elevado.
Por muitos anos, nossos líderes políticos agiram com muito pouca coragem, disse Jean-Claude Meunier, 68 anos, headhunter e oficial aposentado da Marinha francesa, que joga bridge três vezes por semana para treinar a memória e evitar o Alzheimer. As aposentadorias representam a falha de nossos líderes e a falha do sistema. Em Atenas, Iordanidis, o economista que ganha 800 euros por mês numa livraria, antevê uma oportunidade de revisar todo esse sistema rançoso e criar um estado que realmente funcione.